sábado, 19 de julho de 2014

O Filme de Terror III


          - A Diversificação Temática (1980 – 2010)

   
O início da década de 80 viu o terror reforçar-se com uma nova vaga de filmes que lembravam vagamente os “série B, mas com mais “gore” á mistura e  que, apesar de maltratados pela crítica, vieram a tornar-se filmes de culto. Desde logo, Lucio Fulci, realizador italiano, considerado o mestre do cinema “gore” com “City of the Living Dead – Os Mistérios da Cidade Maldita” (1980), onde um jornalista e uma psiquiatra têm de fechar as portas do inferno, abertas pelo suicídio de um padre e impedir que os mortos se ergam dos túmulos; e “Zombi 2 – A Invasão dos Mortos-Vivos” (1979), uma espécie de remake europeu do clássico de Romero,  em que a filha de um médico vai procurar o pai ás Antilhas depois do seu barco chegar ao porto de Nova York  apenas com um morto-vivo a bordo; são dois exemplos do mais puro cinema “gore” que captaram positivamente a atenção do público, principalmente os jovens, sempre sedentos destas coisas.
   
Também em 1980, John Carpenter com “The Fog – O Nevoeiro” continua a ter o dom de saber contar uma história sem recorrer a grandes meios, neste caso uma história de fantasmas que regressam no dia do aniversário da cidade de Santo António, na Califórnia, para recuperar o ouro que lhes foi roubado e matar os descendentes dos seis conspiradores que,  cem anos antes, os conduziram á morte.
Inspirado no “Halloween” de Carpenter, Sean S. Cunningham realiza “Friday the 13th – Sexta-Feira 13” (1980) em que um grupo de jovens vai para Lake Crystal, um campo de férias recentemente reaberto, depois de estar muito tempo fechado devido á morte de um adolescente, onde vão sendo assassinados um a um por um desconhecido. Pautado por mortes para todos os gostos e feitios e um final inesperado, o filme foi um sucesso e deu início á mais longa série de filmes de terror em anos recentes. Lamentavelmente, o primeiro é o único que realmente interessa.
   
Ainda em 1980, Stanley Kubrick adapta o livro de Stephen King, “Shining”, transformando-o numa das obras mais claustrofóbicas de que há memória. A história da família Torrance que vai tomar conta dum hotel durante o inverno onde espíritos malignos levam o pai a ter um comportamento violento enquanto o filho, que tem poderes psíquicos, vê acontecimentos horríveis, do passado e do futuro, tinha tudo para vencer e convencer o público.  Apesar de tecnicamente brilhante e genialmente interpretado por Jack Nicholson, o filme não foi um grande sucesso, não convenceu o público (ou este não o compreendeu), talvez influenciado pela campanha que o autor do livro fez contra o filme por não o achar fiel ao livro, mas eventualmente acabou por se tornar um clássico.  
Ainda ligado á onda de filmes “gore” que tomaram de assalto a década de 80, “Evil Dead – A Noite dos Mortos-Vivos” (1981), a história de cinco amigos que vão até uma cabana na floresta onde descobrem um livro que, sem se aperceberem, vai libertar demónios que se vão apossar dos visitantes. Este filme é um verdadeiro festival sangrento mas a originalidade do argumento, levou a que fosse louvado pela crítica.
   
Em 1982 John Carpenter, ainda nas boas graças da crítica, realiza “The Thing – Veio de Outro Mundo” que, não só é um bom exemplo de terror na sua vertente científica, como também é um remake de “The Thing from Another World – A Ameaça”, realizado na década de 50 por Christian Nyby e produzido pelo grande ídolo de Carpenter, Howard Hawks. Apesar de não ter sido um grande sucesso, o filme acabou por ser considerado um filme de culto pelos seus efeitos especiais algo avançados para a época,  pelo ambiente de paranoia que se vive em todo o filme e também o toque magistral do realizador no final do filme contribuiu para esse efeito. Ainda dentro do género científico, “The Fly – A Mosca” (David Cronenberg, 1986), remake do clássico de 1958, realizado por Kurt Neumann, actualiza a história do cientista louco que se começa a transformar num homem-mosca depois de uma das suas experiências correr mal, é principalmente lembrado pela horrível transformação/mutação  que  vai sofrendo ao longo do filme, graças á caracterização, vencedora de um Oscar da Academia.
   
Em 1984, Wes Craven realiza “A Nightmare on Elm Street – O Pesadelo em Elm Street”, através de Freddy Krueger, um adolescente que foi vitima de várias famílias de Elm Street  que se vinga, povoando e matando adolescentes através dos seus sonhos. O filme foi um grande sucesso de bilheteira e deu inicio a uma outra série de filmes de terror  que fizeram de Freddy, tal como Jason (de Sexta-Feira, 13) , as maiores vedetas de terror da década de 80.
    A primeira metade da década de 90, com algumas raras excepções, continuou muitas das temática iniciadas na década anterior.  As sequelas de algumas séries iniciadas na década de 80, obtiveram algum sucesso e receberam opiniões, positivas e negativas, de uma grande variedade de críticos.
   
De repente, em 1991, o género assume definitivamente o seu lugar na sétima arte. “Silence of the Lambs – O Silêncio dos Inocentes”, realizado por Jonathan Demme e interpretado por “Sir” Anthony Hopkins e Jodie Foster, onde se conta a história de Clarice Starling, uma estagiária do FBI a quem é entregue o caso de “Buffalo Bill”, um “Serial Killer” que rapta e mata adolescentes femininas para lhes roubar a pele. Na sua investigação, Clarice irá cruzar-se com “Hannibal “The Canibal” Lecter, um médico e perigoso “serial killer” que tinha por hábito comer as suas vítimas. Entre os dois irá estabelecer-se uma relação quase paternal, uma espécie de jogo de gato e rato, que tanto tem de revelador como de perigoso. Aquilo que aparentemente parecia ser mais um filme de terror, acabou por se tornar no filme de terror mais importante da década de 90. Para esse estatuto contribuiu a vitória quase total na cerimónia dos Oscares. Das sete nomeações que tinha, o filme venceu cinco e logo nas categorias principais: filme, realizador, actor, actriz e argumento, tornando-se apenas no terceiro filme em toda a história da sétima arte a ser unicamente premiado com as cinco categorias principais.
     
Alguns filmes de terror da década, tais como “Freddy Krueger’s New Nightmare – O Novo Pesadelo de Freddy Krueger” (Wes Craven, 1994), “The Dark Half – A Face Oculta” (George A. Romero, 1993), ou “In The Mouth of Madness – A Bíblia de Satanás” (John Carpenter, 1994), fizeram parte de uma mini-movimento que tratava de aspectos reflectivos ou metaficcionais, ou seja, a acção passava-se entre uma realidade, tal como a vemos no filme e uma ficção criada a partir dessa mesma realidade, uma espécie de mundo ficcional de terror. Este estilo reflectivo iria tornar-se mais aberto e irónico com “Scream – Gritos” (Wes Craven, 1996).
    Mas o final da década, não seria de feição para o género. Dois problemas estiveram na origem da perda de importância do terror: primeiro, as audiências que, na década anterior, absorviam tudo o que se produzia em termos de filme de terror, principalmente o produto que lhes transmitia valentes sustos e era recheado de muito “Gore”, cresceram e necessitavam de procurar outros motivos de interesse; segundo, a substituição deste tipo de filmes por outros muito mais imaginativos, apoiados por uma enorme parafernália de efeitos especiais, principalmente no que toca a imagens geradas por computador, facilitou a rápida ascensão, em detrimento do terror,  de filmes de ficção científica e de fantasia.
   
Para se realinhar com a tendência da sétima arte, o terror teve que se recriar, servindo-se de algum humor, autoparodiando-se, por vezes chegando a ridicularizar-se para obter o efeito mais cómico, como por exemplo fez Peter Jackson em “Braindead – Morte Cerebral” (1992) ou Wes Craven em “Gritos 2 e 3”, fazendo uma menor utilização de humor e referências a filmes de  terror do que fizera no primeiro filme.
    O amanhecer do século XXI, foi calmo para o género. O sucesso mundial de “Matrix” (Andy & Larry Wachowski, 1999)  e suas sequelas, tinham trazido a ficção científica para um plano elevado em relação ao resto dos géneros.  A história de Thomas Anderson, programador de computadores, que descobre que o seu outro “eu”, conhecido no mundo da informática como Neo,  um Hacker , terá um papel importante a desempenhar na revolta dos humanos contra as máquinas, chegou, viu e venceu em praticamente todas as frentes, graças a um argumento inteligente, efeitos especiais revolucionários e uma realização inventiva, relegando para segundo plano tudo o que até aí se tinha feito.
     
A inspiração que veio do Oriente 
No entanto, apesar da calmaria,  algumas tendências no terror emergiram. O filme “Brotherhood of the Wolf –  Pacto com os Lobos” ( Christophe Gans, 2001), tornou-se o segundo maior sucesso de bilheteira do cinema francês nos estados unidos nas últimas décadas; “The Others – Os Outros”  (Alejandro Aménabar, 2001) mostrou que o terror psicológico ainda poderia ser uma boa fonte de sucesso. Também o oriente passou a ser fonte de inspiração  para o ocidente: “Ringu – A Maldição”  (Hideo Nakata, 1998) onde um misterioso vídeo mata, uma semana depois,  quem o vê, a não ser que se consiga resolver esse mistério. O enorme sucesso deste filme e da sua sequela “Ringu 2 – A Maldição 2 “ (Hideo Nakada,1999) , que continua a investigação iniciada no primeiro filme, enquanto a maldição do misterioso vídeo que mata quem o vê, continua a alastrar, levaram a que nos estados unidos se fizesse um remake  intitulado “The Ring – O Aviso” (Gore Verbinski, 2002) e respectiva sequela “The Ring 2 – O Aviso 2” (Hideo Nakata, 2005) onde, com algumas diferenças em relação ao original, se conta basicamente a mesma história; também “Dark Water - Àguas Passadas” (Hideo Najkada, 2002) onde uma mãe e sua filha mudam-se para um apartamento velho cujo tecto e paredes estão quase sempre a escorrer água e ela tenta descobrir o que está na origem do problema, foi objecto de um remake em 2005, com o mesmo título e realizado por Walter Salles.
    
O universo dos Zombies, que George A. Romero tão bem recriara nas décadas de  60 e 70, volta a estar na moda: “28 Days Later – 28 dias Depois” (Danny Boyle, 2002) onde a Inglaterra é contagiada por uma misteriosa praga, que dura 28 dias e  que transforma toda a população atacada em zombies raivosos. O sucesso do filme permitiu que se fizesse uma sequela, “28 Weeks Later -  28 semanas Depois” (Juan Carlos Fresnadillo, 2007) onde seis meses após o surto que atacou a Inglaterra, a situação parece estar a voltar ao normal e prepara-se a re-população das áreas afectadas, mas nem tudo é o que parece. O sucesso da sequela não foi tão grande como o do original, mas não  é uma sequela má de todo; uma actualização de  “Dawn of the Dead – O Renascer dos Mortos-Vivos” (Zack Snyder, 2004) e uma comédia “Shaun of the Dead – Uma noite... de Morte” (Edgar Wright, 2004), encorajou Romero a regressar á sua série mais famosa  com “Land of the Dead – Terra dos Mortos” (2005),  “Diary of the Dead – Diário dos Mortos” (2007) e “Survival of the Dead” (2009).
   
Além de alguns remakes ( a maior parte deles sem qualquer interesse ou qualidade) de filmes das décadas anteriores, hoje clássicos indiscutíveis, que caracterizaram a maior parte dos primeiros anos do novo século, houve um subgénero que se destacou, também ele inspirado na exploração do género  que se fez nos anos pós-vietname: filmes baseados  em tortura, sofrimento e morte violenta, no qual se destacam “Hostel” (Eli Roth, 2005), e, principalmente “Saw – Enigma Mortal” (James Wan, 2004), onde dois homens acordam acorrentados numa casa de banho sem saber como ali foram parar. Os dois têm de seguir uma série de regras e jogos se quiserem sobreviver e sair daquela prisão. Explorando a violência gráfica sem qualquer pudor, “Saw” e as suas sequelas foram um enorme sucesso de bilheteira, tendo inclusivamente recebido uma menção no Livro de Recordes do Guiness  para o filme de terror com maior receita num dia só de exibição. “Saw” tornou-se num filme de culto e , até ver, o único produzido na primeira década do século XXI.

O Género não mostra vontade de parar, nem de se reafirmar no universo da sétima arte. É assim que gostamos!

Nota: as imagens que ilustram o texto foram retiradas da Internet

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